Há pessoas que, no instante em que o amor se torna possível, tropeçam. Que se distanciam quando o outro se aproxima. Que tratam com frieza quem os trata com cuidado. E, muitas vezes, nem entendem por quê.
Na escuta psicanalítica, essa dinâmica aparece com frequência. O sujeito diz que deseja amor, diz que quer ser visto, escolhido, cuidado. Mas quando isso se apresenta, quando alguém acolhe, quando o outro não se impõe como ameaça, mas se oferece como presença, o medo vem. E junto dele, uma defesa: o ataque.
É um tipo de orgulho que protege, mas que também aprisiona. A frase inconsciente pode ser algo como: “Se eu for a primeira a machucar, não corro o risco de ser ferida.” Assim, o afeto é ridicularizado, o outro é diminuído, a relação é desmontada antes mesmo de se formar. O amor vira piada. A reciprocidade vira incômodo. E o cuidado vira suspeita.
Por trás disso, quase sempre há uma história de desamparo, uma infância onde o amor não foi confiável, onde o olhar do outro não sustentava, mas julgava; onde o afeto vinha misturado com dor, exigência, ou ausência. E o sujeito cresce aprendendo que não dá pra confiar no que é bom, que tudo que se aproxima vai machucar, ou cobrar, ou abandonar.
Então, se aparece alguém que trata bem, que cuida, que não grita, que não humilha, é como se faltasse chão. A pessoa não sabe como existir nesse novo cenário. E tenta, inconscientemente, recriar a cena conhecida, onde ela sabe como agir, mesmo que isso custe mais sofrimento. O sofrimento, afinal, é conhecido. O amor, não.
Por isso, é comum ver quem ama se escondendo atrás de discursos elaborados, racionalizações convincentes, certezas bem construídas. E ainda assim, no fundo, uma pergunta ecoa: "por que eu não consigo viver algo bom?"
Na psicanálise escutamos o que esse movimento tenta proteger, afinal, tem gente que aprendeu que desejar é perigoso, e ser amada pode doer mais do que ser rejeitada.
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